Escritora troca jornalismo por ficção e vira best-seller

Por Leandro Colon

Paula Hawkins, 43, é a escritora do momento entre os britânicos com o best-seller “The Girl on the Train”, lançado semana passada no Brasil (“A Garota no Trem”, pela editora Record).

Rachel é a “garota” que pega todo dia o trem, às 8h04. É uma alcóolatra paranoica, em decadência profissional e pessoal. O livro está há mais de 27 semanas entre os mais vendidos da lista do “New York Times”- 20 delas ficou em primeiro lugar (hoje aparece na segunda posição). No Reino Unido, desbancou o recorde de 19 semanas de “O Símbolo Perdido” de Dan Brown, best-seller de 2009.

Conversei com a escritora em Londres na semana passada (leia aqui matéria publicada na Ilustrada na última quinta-feira).

Paula Hawkins trabalhou por 15 anos como jornalista em veículos do Reino Unido. Há dois anos, decidiu de vez largar as redações para investir na carreira de escritora. Por enquanto, tem dado certo.

Abaixo, segue a íntegra da entrevista com ela:

Sente falta do jornalismo?
Eu sinto falta de algumas coisas, como do ambiente de redação, estar lá quando grandes histórias estão acontecendo. Fiquei 15 anos, e não estava feliz. Nos últimos anos os jornais britânicos não têm sido lugares bons para trabalhar, tempos difíceis, foi um momento bom para sair.

Em entrevista ao “The Guardian”, a sra. disse que o livro era sua última chance para não ter que voltar ao jornalismo para se sustentar.
Eu trabalhava como jornalista e usava um outro nome para escrever ficções por vários anos. Eu não queria voltar para o jornalismo. Queria ter uma carreria de ficção, mas o ponto era que eu tinha que fazer algo a mais. Pensei: ok, acho que vai dar certo, senão vou ter que voltar ao jornalismo ou buscar um novo emprego.

Paula Hawkins, autora de "A Garota no Trem". Crédito: Anna Huix/The New York Times
Paula Hawkins, autora de “A Garota no Trem”. Crédito: Anna Huix/The New York Times

A sra. esperava que o livro se transformasse num best-seller, quebrasse recordes e virasse até um filme?
Não. Eu estava otimista porque tinha um bom feed-back de minha agente, e a editora estava muito animada, mas nunca pensei que seria um fenômeno tão extraordinário.

E qual a sensação em ser um best-seller?
É muito estranho. Obviamente, é maravilhoso, mas também um tanto assustador, porque todas essas pessoas estão com seu livro nas mãos e tendo opinião sobre ele.

O livro tem um pouco the Hitchcock.

Certamente. Eu gosto de Hitchcock e queria criar um tipo de atmosfera dele, como a paranóia claustrofóbica, um suspense de coisas em que todos personagem duvidam sempre deles um do outro.

Por que o livro virou um fenômeno?
É muito difícil de responder. Acho que é uma combinação de fatores que o levaram a decolar. Mas também isso é um mistério, porque se você soubesse exatamente porque é um best-seller, faria exatamente a mesma coisa da próxima vez. As pessoas se prendem no suspense, e continuam lendo, lendo e lendo. A Rachel (personagem principal) é controversa, envolve todo mundo que tem uma opinião sobre ela. Todo mundo se identifica com isso na vida.

Como vê a comparação do seu livro com “Garota Exemplar”?
Bem (risos…). Eu penso que é um ótimo livro, gostei muito, mas são bem diferentes. Acho que a comparação é feita porque as duas protagonistas são muito problemáticas e não confiáveis. Amy (de “Garota Exemplar) mente, enquanto Rachel não consegue lembrar o que fez. Posso ver similaridades, mas são livros diferentes.

Como criou a história? Houve alguma inspiração real?

Levei um ano para escrever. Tive a ideia de que deveria ser algo envolvendo trens, porque estou acostumada a usá-los, vivo em Londres, é algo muito londrino. Especificamente, queria escrever sobre alguém que tivesse um problema com bebida e que isso afetasse sua memória. Tive, na verdade, essas duas ideias juntas (bebida e trem), porque poderia escrever sobre o que ela vê do trem, o que pensa sobre isso.

O final, como todo suspense, é o que mais se espera de um livro como o seu – no caso, o mistério em torno do desaparecimento da Megan. No período em que estava escrevendo, chegou a mudar o final?

Antes de escrever o livro, eu já sabia quem era responsável por isso (o desaparecimento de Megan), um esboço escrito, algo imaginado. Mas muitas coisas foram mudando do original, porque começaram a fazer conexões enquanto escrevia, como a narração da Rachel, e opiniões da Megan. No fim, a Rachel passa a gostar da Anna, isso foi mudado também.

Como a sra. descreveria Rachel, a “garota no trem”?

Uma pessoa confusa e incrivelmente infeliz, e muito reconhecível. Qualquer um pode se pegar nessa situação. Ela vai tocando a vida, tudo bem, bebe muito, mas tudo bem. Foi casada, amou seu marido, e as coisas começam a dar errado e desmoronar de repente. Muitos de nós conhecemos alguém assim, que é do bem, do qual você gosta, mas que começa a perder o controle rapidamene das coisas quando perde um emprego e agora busca tentar ser quem era antes, feliz e mais forte.

Há alguma inspiração real, pessoal, para Rachel?

Eu conheço pessoas com problemas de vícios, mas ela não é baseada em ninguém particularmente. Muito da imaginação vem da experiência de outras pessoas. Os nomes também foram imaginados, assim como o lugar em que o livro se passa. Eu queria criar um espaço meu, criar uma configuração para a história.