Viajar pela Ucrânia é atravessar fronteira entre dois países

Por Leandro Colon

O conflito entre separatistas e forças ucranianas criou fronteiras informais dentro do próprio país e um controle no trânsito de pessoas que deixam áreas dominadas por rebeldes – e vice-versa.

Com o fechamento dos aeroportos de Donetsk e Lugansk, sob domínio separatista pró-Rússia, estrada e trem são as únicas maneiras de sair e chegar. É barreira que não acaba mais…

Na prática, criaram uma espécie de imigração de cada lado. Sem o passaporte, você não circula dentro do país.

Madrugada de sexta para sábado: na estrada a caminho de Donetsk. Crédito: Leandro Colon
Madrugada de sexta para sábado: na estrada a caminho de Donetsk. Crédito: Leandro Colon

Para ir de Kiev a Donetsk de carro na semana passada, em 13 horas de viagem, passei por várias barreiras ucranianas, na área sob domínio de Kiev, e também dos rebeldes, quando cheguei mais próximo da região controlada por eles.

Um motorista local me levou junto com outros quatro colegas jornalistas que encontrei por acaso no aeroporto da capital (na foto ao lado, estou no banco de trás, a caminho do leste, na madrugada do dia 19).

Na quarta-feira (23), peguei um trem em Donetsk, em poder dos rebeldes, com destino a Dnipropetrovsk, a 215km dali, uma das principais cidades do país nas mãos do governo.

Por questões de segurança, comprei o bilhete de uma cabine fechada para viajar sozinho, afinal, eram seis horas de viagem. Não adiantou muito. No meio do caminho, quatro soldados ucranianos abriram a porta.

Estava tentando cochilar e tomei um susto. Em meio a tantas palavras ditas por eles, entendi “passaporte” e “Donetsk” – havia dispensado meu tradutor porque não imaginava precisar dele no trem. Pelo que tinha entendido, os soldados queriam meu documento e, talvez, saber porque estava em Donetsk.

Policiais ucranianos fiscalizam quem chega de trem da região de Donetsk
Policiais ucranianos fiscalizam quem chega de trem da região de Donetsk. Crédito: Leandro Colon

Num lapso de segundos lembrei que dentro do passaporte estava um tipo de autorização dos rebeldes para que, como jornalista, eu pudesse circular na região dominada por eles.

Temi que os ucranianos não entenderiam o porquê daquele documento, sei lá, poderiam me vincular aos separatistas. Era melhor que não vissem. Discretamente, o joguei na mochila.

Entreguei o passaporte, olharam, conversaram entre eles e me liberaram. Fizeram o mesmo nas outras cabines e continuaram a vasculhar outros vagões.

Seis horas depois, na chegada à estação de Dnipropetrovsk, a tensão continuou, não só para mim, mas para todos passageiros.

Policais fizeram uma barreira na escada de saída da estação. Pediam passaportes de todos e abriam as malas. Fiz a foto acima, ficou com pouca qualidade porque tive de clicar correndo.

Na estrada, o controle é o mesmo. Em comum, além dos “check points”, a simpatia da maioria deles quando recebem um passaporte brasileiro. Nenhum dos lados nos vê como inimigos.